sexta-feira, 2 de outubro de 2009

De quando damos conta de que falhou tudo o que fizemos para conseguirmos um amor

Mais um texto que não me pertence, mas como não o 'roubar', se vem claro e límpido, descrevendo lucidamente os desarranjos do amor? Esses que me emudecem...
Obrigada, Goldmundo.

Palavras muito simples e muito sábias de Clarice Lispector, publicadas aqui mesmo ao Lado, despertaram em mim a vaga tristeza própria de quem sempre se atrasa ou se adianta e não sabe porquê. «Quando chegares, saberei quem és» poderia ser o primeiro verso de um poema sobre a misteriosa avaria de um relógio apaixonado que nunca acerta a hora pelo bater do coração amado. Uma espécie de "maquenismo" que teima em não abrandar, apesar de a regularidade do Tempo ser sempre a mesma desde os primórdios - e nunca, mas nunca, permitir ajustamentos.

Nada fazer é, sem dúvida, a vacina capaz de aniquilar esse vírus tão mortal do desacerto. Mas nada fazer é também impossível para a própria natureza da paixão. Porque não há paixão sem doença, sem atropelo da ordem interior, sem terramoto nos ossos, sem erupção do sangue espesso que se forma nas veias e nas artérias à beira da explosão. A paixão escolhe apenas a parte de nós que nada sabe, que nada pensa, que não se distancia: a paixão reduz-nos à paixão. E quando damos conta de que falhou tudo o que fizemos para conseguirmos um amor, já a aceleração nos levou para além da nossa capacidade de inércia.

O trabalho seguinte, sempre atrasado porque a paixão se adiantou, consiste já não em nada fazer, porque o que fizemos está feito, mas em voltar a aprender a acertar o passo com o ritmo que vida quer de nós.

Por isso dói.
 
 
Texto de Goldmundo, no seu Diário

6 comentários:

  1. excelente texto.obrigada por o teres trazido para aqui, de modo a partilhá-lo connosco.

    abraço

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  2. excelente texto.... palavras serão sempre mais do que palavras.... escrever não é simplesmente junta-las..... e sim saber juntá-las
    www.valterfigueira.blogspot.com

    um abraço

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  3. Por isso dói. E tanto, naquelas noites que mais custam a passar.

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  4. "Espaço sem portas, sem estradas, o do amor.

    O primeiro desejo dos amantes

    é serem velhos amantes.

    E começarem assim

    o amor pelo fim."

    Regina Guimarães

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  5. Olá Ana Prado
    Volto à sedução deste espaço onde cheira a amores perfeitos, na esperança que quebres o silêncio e te deleites nos jardins do Portugalmaresias.

    que espaço tão belo
    onde a flor do Prado rejubila
    doce paz de jardim em cujo zelo
    a brisa corre fresca o ar sibila

    quem entra respira suave aroma
    sentindo nas palavras nostalgia
    se homem se embrenha na luz policroma
    se mulher se envolve em poesia

    qual mito de harmonia singela
    assim a terra arde no fogo da mudança
    em gestação prolifera a doce bela
    na água cristalina onde a alma dança

    quando tento sem êxito ser o sorriso
    dentro dos olhos que iluminam rutilantes
    a alma de uma mulher de douto siso
    fico suspenso nos seus sons vibrantes

    se eu fosse poeta escreveria
    sobre os teus cabelos dourados
    odes murmuradas de infinita alegria
    em versos de diamanteslapidados

    ah se eu tivesse a ousadia
    de ser aquele cujo dom encanta
    subir ao ponto mais alto da tua rebeldia
    e aceder à alma de pureza tanta

    Um beijinho de amizade e admiração poética
    joão raimundo

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  6. De quando nos damos conta de que nada fizemos para merecermos um amor:

    Perdi-me na inexistência
    dum espelho
    que me devolvesse
    uma ténue miragem
    de quem sou.
    Morri ilha...
    H.V.

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