terça-feira, 12 de janeiro de 2010
obstinação
Irresistible love, Hesham Abrishami
vivo dos silêncios ínfimos
com que separas as palavras;
desses fugazes intervalos,
onde não mora a razão
e te rendes sem saberes...
nunca tive quem me amasse,
assim, sem querer...
nem nunca pedi tanto à vida...
quinta-feira, 7 de janeiro de 2010
tempos modernos
Ela canta, pobre ceifeira,
Julgando-se feliz talvez;
Canta, e ceifa, e a sua voz, cheia
De alegre e anónima viuvez,
(...)
Ah, poder ser tu, sendo eu!
Ter a tua alegre inconsciência,
E a consciência disso! Ó céu!
Ó campo! Ó canção! A ciência
Pesa tanto e a vida é tão breve!
Entrai por mim dentro! Tornai
Minha alma a vossa sombra leve!
Depois, levando-me, passai!
Fernando Pessoa, excerto de "Ela canta, pobre ceifeira"
domingo, 3 de janeiro de 2010
revisito-me II
A vida acontece às portas alheias. Nas luzes acesas na noite, no telefone que toca na casa do lado. Nos sorrisos que não sei. Nas tristezas que nem sinto.
Teimosa, uma lágrima escorre pelo silêncio, toca-me os lábios, que se abrem ao seu sal. Aconchego-me ao corpo e subo para a noite.
As escadas rangem.
Paro, param.
Subo, gemem.
Sofrem comigo o peso de uma solidão que é minha.
Luzes pontilham a cidade que se estende. Embora oculto na escuridão, sei o mar ao fundo. Vim aqui algumas vezes, logo pela manhã, bem cedo, e a sós com o azul intenso, fiz a prece pela vida. Cansados, os barcos regressavam do amor violento e, à sua espera, gaivotas dançavam a saudade desfeita.
Mas a hora é tardia e a cidade descansa. Os barcos entregam-se às carícias; as gaivotas dormem cuidados. Eu não sou.
Desço. As escadas dizem-me que a solidão mata. Nada sentira a minha falta. Deito-me na casa que não me espera, abraço-me ausência e os amores perdidos parecem mais próximos.
Menos irremediáveis.
Teimosa, uma lágrima escorre pelo silêncio, toca-me os lábios, que se abrem ao seu sal. Aconchego-me ao corpo e subo para a noite.
As escadas rangem.
Paro, param.
Subo, gemem.
Sofrem comigo o peso de uma solidão que é minha.
Luzes pontilham a cidade que se estende. Embora oculto na escuridão, sei o mar ao fundo. Vim aqui algumas vezes, logo pela manhã, bem cedo, e a sós com o azul intenso, fiz a prece pela vida. Cansados, os barcos regressavam do amor violento e, à sua espera, gaivotas dançavam a saudade desfeita.
Mas a hora é tardia e a cidade descansa. Os barcos entregam-se às carícias; as gaivotas dormem cuidados. Eu não sou.
Desço. As escadas dizem-me que a solidão mata. Nada sentira a minha falta. Deito-me na casa que não me espera, abraço-me ausência e os amores perdidos parecem mais próximos.
Menos irremediáveis.
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Ser de nenhures, revivo o tempo que aqui ecoa.
Ser de nenhures, revivo o tempo que aqui ecoa.
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